Litvinenko assinou a sua morte no dia 17 de Novembro de 1998
A tentativa de encontrar as respostas a estas perguntas levaram Martin Sixsmith, um antigo correspondente da BBC em Moscovo, a investigar o que aconteceu antes e depois do fatídico dia 1 de Novembro do ano passado, data em que o ex-agente do KGB foi envenenado com polónio-210, uma substância altamente radioactiva.
O resultado dessa investigação foi agora publicado no Reino Unido pela editora Macmillan: The Litvinenko File - The true story of a death foretold. (O Ficheiro Litvinenko - A verdadeira história de uma morte anunciada) Neste livro, Sixsmith aborda muitas das premissas de que partiu a Scot-land Yard, que terá chegado a um beco sem saída. Em parte, devido à legislação russa que impede Moscovo de extraditar os seus cidadãos.
Um argumento que poderá ajudar a perceber as razões que levaram a coroa britânica a não ter deduzido qualquer acusação, quase seis meses depois de Litvinenko ter sucumbido aos efeitos do Polônio-210, numa ala isolada de um hospital londrino. Mas as conclusões a que Sixsmith chegou não deverão ser muito diferentes das deduções da Scotland Yard, cujo trabalho é muitas vezes citado em The Litvinenko File.
Para Martin Sixsmith o momento-chave para se perceber o assassínio de Litvinenko reside numa conferência de imprensa que o ex-tenente-coronel do KGB (já designado por FSB) deu na capital russa, a 17 de Novembro de 1998.
Nesse dia, Litvinenko assinou a sua sentença de morte ao denunciar em público uma conspiração do FSB para assassinar o multimilionário Boris Berezovski, sustentando ainda que a actuação dos serviços de segurança russos estava minada pela corrupção. Mas o que, nessa altura, poucos terão percebido é que por trás das denúncias de Litvinenko estava, segundo Sixsmith, uma manobra para condicionar Vladimir Putin, recém-nomeado para dirigir o FSB.
O facto é que esta conferência de imprensa viria a assumir uma grande importância muitos anos depois. Quanto mais não seja pela identidade das pessoas que ladeavam Litvinenko, algumas das quais estavam encapuzadas. Martin Sixsmith identifica-as agora: Viktor Shebalin (que à data era tenente-coronel do FSB); Andrei Ponkin (major); Alexander Gusak (coronel); Mikhail Trepashkin (tenente-coronel).
De uma forma ou de outra, os três primeiros voltaram a trabalhar para o FSB e apareceram em público há uns meses para denunciarem Alexander Litvinenko como "traidor", insinuando que ele tinha sido morto devido às suas actividades no submundo do contrabando, do tráfico e da chantagem.
Já Trepashkin, que deixou o FSB, transformando-se num advogado, está preso nos Urais, tendo sido impedido de falar com a Scotland Yard.
E, no entanto, foi Trepashkin que, por mais de uma vez, avisou Litvinenko de que a sua cabeça estava a prémio e que havia elementos do FSB - no activo ou já reformados - que pretendiam eliminá-lo.
Por várias razões. Primeiro, porque Litvinenko tinha quebrado os códigos de honra (e de silêncio) de organizações como o FSB. Depois, porque sabia demais, nomeadamente sobre a Chechénia e a criação de esquadrões da morte. E, finalmente, porque teria denunciado ao MI5 vários agentes da Rússia no Reino Unido.
Como se isso não bastasse, Litvinenko dedicava-se, ainda, a recolher informações sobre eventuais parceiros de negócios na Rússia, tendo sido responsável por ter feito abortar projectos de muitos milhões.
Razões que levam Sixsmith a concluir que os responsáveis pela morte de Litvinenko "devem ser encontrados" dentro dos serviços de segurança russos ("FSB, militares do GRU ou serviços secretos do SVR"), que têm acesso a substâncias como o Polônio-210, dispõem de tempo para planear operações e não precisam de autorização para as executar.
A partir daqui, só faltava encontrar quem transportasse o Polônio-210. De preferência, alguém que conhecesse Berezovski, permitindo, assim, que fosse enviado um "recado" ao oligarca. E, desse ponto de vista, quem melhor do que uma pessoa que já tivesse trabalhado para ele?